As cidades são os amigos que dão fisionomia a seus labirintos.

O Rio de Janeiro sempre será o apartamento de Roquete Pinto, o cartório de Olegário Mariano, a caminhada com Manuel Bandeira pela Lapa, o telefonema para Luís Peixoto, o alô a Álvaro Moreyra, o som do piano de minha tia Yacyra, o solar de Ana Amélia Carneiro de Mendonça.

Belém do Pará traz o abraço de Georgenor Franco, o lirismo de Bruno de Menezes e de Rodrigues Pinagé, a “Aruanda” de Eneida.

O Amazonas continua navegado pelas palavras de Ramayana de Chevalier.

Porto Alegre sem Manoelito de Ornellas, Dante de Laytano, Walter Spalding e Mário Quintana, é minuano de lembranças.

Como chegar a Belo Horizonte, desencontrar de Bueno de Rivera, e não receber a bênção de Henriqueta Lisboa?

Salvador sem Godofredo Filho, Camilo de Jesus Lima, Odorico Tavares e o solar Adriano Gordilho com seu anfitrião Maneca Pedreira, é uma cidade estranha!

Voltar a Recife e não falar com Mauro Mota, ir a Fortaleza sem visitar Carlyle Martins e Adbias Limas, seria naufragar minha jangada!

O mesmo que chegar a uma Florianópolis sem George Lacerda!

Atravessar a baía na barca de Niterói e não avistar a fumaça do cachimbo de Nóbrega de Siqueira; desembarcar em João Pessoa e não tomar água de coco em companhia de José Américo, em Tambaú, não tem sentido.

E o meu Natal então? Como descer no Aeroporto Augusto Severo e não receber o abraço fraterno de Augusto Severo Neto!

Quem me levará a rever a Casa de Maria Boa e o Forte onde os Reis Magos ouviram os poemas de Newton Navarro?

Como retornar à Avenida Junqueira Ayres e não almoçar com Luís da Câmara Cascudo?

E Goiás Velho, hoje tão distante, sem Cora Coralina!

E as cartas que não chegam mais, a letra de Adalgisa Nery subscrevendo o envelope – São Paulo, o forte; a mensagem de Cecília Meireles, o bilhete de Drummond e a notícia de Guimarães Rosa marcando encontro no galpão de Martinico Ramos!

O guardador de memórias tange pela tarde o rebanho das saudades tresmalhadas.