PAULO BOMFIM, além dos talentos já decantados, continua a exercitar o dom de surpreender. É uma fonte insuplantável de criatividade. A pressa de seus passos, a inquietude evidenciada na sua rotina, é a mesma que o impulsiona a produzir. Aceleradamente, aos borbotões, num jorro imaginativo denso e incessante.

Esta filosofia poética ora entregue a leitores de todas as idades não é mero conjunto de pensamentos. É um acervo de máximas destinadas a provocar atitudes concretas. Fonte inesgotável de ensinamentos que a posteridade consagrará. Condensa emoções em setas certeiras: atingem o alvo. Desconcertam. Fazem pensar. E pensar é cada vez mais difícil nestes dias de muita ação e nenhuma reflexão. Ele tem consciência disso quando anuncia: "Diante de tantas máquinas pensantes ousemos pensar".

Nem sempre os coetâneos têm noção da profundidade de uma obra. Conviver com a genialidade pode ser imperceptível. Raro que alguém se detenha ante a magia do próprio existir. PAULO BOMFIM consegue instigar esse exercício. Obriga a meditar e pode gerar milagres. É o que se pressente e se vaticina para este livro. O decantar das gerações vai revisitar o que for digno de preservação nesta era de superficialidades. Os axiomas postos aqui à apreciação da lucidez permeável ao belo serão testemunho de que nem tudo estava perdido no turbulento início do século XXI.

Sintetizar reflexões é missão de que raros espíritos conseguem se desincumbir. Vivencia-se a era da prolixidade, das frases intermináveis, das imagens deterioradas pela reiteração monocórdica dos que muito falam, sem ter nada a dizer. Nada que se aproveite, nada que se perpetue. A fatuidade típica dos que só conseguem se deleitar com o próprio zumbido ególatra.
A concisão proclamada pelo poeta não elimina, antes estigmatiza, a profundidade de suas elucubrações. Está¬-se perante uma arca mágica, repleta de genes de sabedoria. Cada qual deles, inseminado em consciência fértil, fará germinar novas primícias do gênero humano.

Ninguém será o mesmo depois de abrir a arca. Este baú é seminal, porque apto a produzir pessoas novas. Embebidas de infinitos olhares sobre si mesmas, sobre a vida, sobre os sentimentos. Sobre o encanto de pertença a uma categoria prenhe de mistérios e de indagações irrespondíveis.

Este encontro não será em vão. Impossível a leitura descompromissada. Toda blindagem será profanada. A força emanada do verbo desencadeará vendavais nas estruturas aparentemente sólidas. Ninguém resistirá imune ao poder das palavras de PAULO BOMFIM. Seu vaticínio se cumprirá: "Creio no poder das palavras, casulos que transportarão nossa essência a épocas que nem ousamos sonhar".

Diário do anoitecer é um grande livro. Permanecerá, será comparado a outros clássicos, quais os pensamentos de Pascal. Será utilizado por quantos mendigarem inspiração. Servirá de motivação para que os estudiosos da filosofia dissertem sobre as instigações nele contidas. Abençoado território do engenho bomfiniano, eficaz ao repartir os dons com a prodigalidade que é o seu signo.

Embora os escritos se desvinculem do criador e adquiram existência própria, assim que postos à luz, impossível deixar de reconhecer esta patente paternidade_ Diário do Anoitecer resplende o DNA do Príncipe dos Poetas Brasileiros.

Os contemporâneos de PAULO BOMFIM apenas intuem a excelência de seu caráter. Homem generoso, projeta a sua imagem nos humanos que têm o privilégio de seu convívio. A pureza do poeta só detecta o lado luminoso da espécie. Toda criatura reveste, para ele, um encanto próprio.

O Evangelho existencial do bandeirante paulistaníssimo conseguiu implementar o ideal que o cristianismo persegue. PAULO BOMFIM é a prova de que a fraternidade pode reinar entre os humanos. Na esfera profana, aquilo que a seara jurídica tenta incutir em vão nas mentes contaminadas pela rigidez da técnica — o sentido da dignidade da pessoa humana — o coração ingênuo de PAULO BOMFIM sempre dominou. Desvendou-o com o cérebro menino, que as dores não petrificaram. Prossegue magnânimo e aberto. Disponibiliza uma pós-graduação em humanismo.

Em seu precoce testamento filosófico — pois já o adorna a glória da verdadeira imortalidade — desnuda em confissão: "Legarei minha emoção aos indiferentes, o riso aos lábios moços que murcharam, a lágrima aos incapazes de sofrer, a rebeldia aos acomodados, calor aos corações polares e esta paixão ao desamor do mundo".

Numa quadra de crises e de desalento, refletir sobre as lições que seguem é uma transfusão de confiança na espécie. A melhor resposta é aderir a um projeto que pareceria utópico, não fora a certeza de que seu formulador o vivencia na prática.

Aprendamos com PAULO BOMFIM e tenhamos a coragem de bradar: "Não sejamos alheios mas façamos de nós bandeiras inconformadas, pavilhões contraditórios, pendões de altivez, trapos de ouro e lama ondulando sobre aqueles que se fazem de mortos".

Um reparo não se consegue evitar: Diário do anoitecer não é título adequado. Melhor seria Diário do alvorecer, pois a alma fecunda de PAULO BOMFIM outorga uma aurora ética para todos os famintos de solidariedade e de esperança.

Saciemo-nos sem hesitação! O banquete é apetecível!

 

José Renato Nalini

Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo

Membro da Academia Paulista de